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Quem se reconhece e se aceita - quem é humilde - não tem medo de errar. Por quê? Porque se, depois de ponderar prudentemente a sua decisão, comete um erro, isso não o surpreende: é próprio de sua condição limitada. São Francisco de Sales dizia-o de uma forma muito expressiva: "Por que surpreender-se de que a miséria seja miserável?"Lembro-me ainda daquele dia em que subia a encosta das Perdizes, lá em São Paulo, para da a minha primeira aula na Faculdade Paulista de Direito, da PUC.
Ia virando e revirando a matéria, repetido conceitos e idéias. Estava nervoso; não sabia que impressão causariam as minhas palavras naqueles alunos de rosto desconhecido... E se e fizessem alguma pergunta a que eu não soubesse responder...? E se, no meio da exposição, eu esquecesse a sequência de idéias...?
Entrei na sala de aula tenso, com um sorriso artificial. Comecei a falar... Estava excessivamente pendente do que dizia e nem olhava para a cara dos alunos. Falei quarenta e cinco minutos seguidos sem interrupção, sem consultar uma nota sequer. Percebi, porém, um certo distanciamento
da "turma", um certo respeito... Um rapaz, muito comunicativo e inteligente, talvez para superar a distância
criada entre o grupo e o professor, aproximou-se e cumprimentou-me: "Parabéns, professor.
Que memória! Não consultou em nenhum momento os seus apontamentos...Foi muito interessante..."Respirei... Mas, desconfiado, quis saber: "Você entendeu o que eu disse?"
Admirou-se com a minha pergunta: não a esperava. Sorrindo, encabulado, confessou-me: "Entendi muito pouco..." E, pelo que pude observar, a 'turma' entendeu menos ainda".
A lição estava clara: "dei a aula para mim e não para eles. Dei a aula para demonstrar que estava capacitado, mas não para ensinar". Faltara descontração, didática, empatia; não fizera nenhuma pausa, nenhuma pergunta... Fora tudo academicamente perfeito, como um belo cadáver...Fora um fracasso.
Lembro-me também de que, quando descia aquela encosta, fiz o propósito de tentar ser mais humilde, de preparar um esquema mais simples, de perder o medo de errar, esse medo que me deixara tão
tenso e tão cansado...
De pensar mais nos meus alunos e menos na imagem que eles pudesem fazer de mim...
E se me fizessem uma pergunta a que não soubesse responder..., que diria? Pois bem, diria a verdade..., que precisava estudar a questão com mais calma e, na próxima aula, lhes responderia...
Tão simples assim...
Que tranquilidade a minha ao subir a encosta no dia seguinte!... E que agradecimento o dos alunos ao verem a minha atitude mais solta, mais desinibida, mais simpática!
Uma lição que tive de reaprender muitas vezes ao longo da minha vida de professor e de sacerdote: a simplicidade, a transparência, a espontaneidade são o melhor remédio par a tensão e a timidez, e o recurso mais eficaz para que as nossas palavras e os nossos desejos de fazer o bem tenham eco.
Não olhemos as pupilas alheias como se fossem um espelho ao qual se reflita a nossa própria imagem; não estejamos pendentes da resposta que esse espelho possa dar às perguntas que a nossa vaidade formula continuamente: "O que é que você pensa de mim? Gostou da colocação que fiz?" Tudo isso é raquítico, decadente, cheira ao mofo do próprio Eu, imobiliza e retrai, inibe e tranca a espontaneidade. Percamos o medo de errar, e erraremos menos. (p.33-35)
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